O XXI Congresso Brasileiro de Economia contou com palestras de renomados especialistas do segmento econômico. Em um momento que exige o fortalecimento do debate, as exposições agregaram valor à discussão central do evento: a apropriação e a distribuição da riqueza no Brasil. Tudo isso com pluralidade de opiniões e ideias e debatendo assuntos fundamentais para o momento que o país vive. Sem lugar a dúvidas, um evento que dignificou a ciência econômica. Veja abaixo alguns dos melhores momentos das falas de cada um dos palestrantes:
Eduardo Suplicy (Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo): Os Doze Anos do Programa Bolsa Família e a Renda Básica da Cidadania
“Precisamos ainda avançar, embora tenhamos progredido muito nesses últimos anos. Hoje são mais de 14 milhões de brasileiros beneficiados com o Bolsa Família”
“Se desejamos acabar com a pobreza absoluta e colaborar para a construção de uma sociedade mais igualitária e justa, então, junto a outros instrumentos, uma boa solução é a instituição de uma Renda Básica de Cidadania”.
“A Renda Básica de Cidadania não corresponde à caridade e à assistência, mas a um direito conferido a toda e qualquer pessoa”.
“Infelizmente o Brasil é um dos países com mais desigualdade entre sua população. Somos o 16º país mais desigual do mundo”.
Marcio Pochmann (UNICAMP): A Distribuição da Riqueza no Brasil
“A renda gerada pelas forças de mercado tem tendência à concentração. Em breve os 1% mais ricos concentrarão mais riqueza que os demais 99%”.
“Países com índice de Gini baixo são países que em algum momento viveram uma experiência de ruptura, de revolução. A revolução é importante porque ajuda a alterar o estoque de riqueza. São também países que passaram por reformas no século 19 ou 20, reformas que não alteraram a propriedade, mas sim os fluxos de renda”.
“Somos um país sem tradição democrática, que tem dificuldades de conviver com a tolerância. Também não tivemos revoluções que rompessem com a estrutura de poder. Até hoje não fizemos reformas como a reforma agrária e a reforma tributária”.
“Nós dizemos que temos cidades. Na verdade, temos acampamentos. Espaços segregados. Não temos saneamento. No Rio de Janeiro o sistema de saneamento é medieval. Os pobres são afastados do centro. Aí você precisa ter aparelhos públicos por todos os lados e isso tem um custo muito alto. No centro, os aparelhos públicos estão nas áreas mais nobres; na periferia, nas áreas mais rejeitadas”.
Esteban Pérez (CEPAL/CHILE): A Visão Cepalina sobre a Distribuição da Riqueza e a sua Importância para o Crescimento da Economia
“A capacidade do estado e das instituições para reduzir a desigualdade na América Latina é limitada. A CEPAL enfatiza as condições de trabalho como chave para entender a desigualdade. Nós observamos um aumento no suprimento de trabalhadores qualificados e uma demanda maior por trabalhadores não qualificados. Mas há que se lembrar também que as mudanças na distribuição de renda respondem não apenas a fatores reais, como também financeiros”.
José Luis Oreiro (UFRJ e AKB): A Visão Keynesiana sobre a Distribuição da Riqueza e a sua Importância para o Crescimento da Economia
“Para que a taxa de juros neutra seja próxima de zero, levando à eutanásia do rentista, a propensão ao consumo deve ser baixa. Keynes dizia para primeiro fazer os investimentos produtivos necessários e só depois mexer na renda. Os países que adotaram o estado do bem-estar social fizeram o caminho contrário, aumentando a propensão ao consumo e elevando, desta maneira, o valor da taxa de juros neutra”.
Sergio Margulis (IPEA): A Economia e o Meio Ambiente
“A nova classe média está se inserindo no mercado de consumo, mas isso não está acontecendo de forma limpa. Uma pessoa vai comprar seu primeiro carro, e tem todo o direito de fazê-lo, mas compra um carro de 1978, muito poluente, com baixa eficiência energética. Compra uma geladeira já usada, e tem todo o direito de fazê-lo, mas é uma geladeira que consome muita energia. Não é fácil fazer o balanço entre o aproveitamento econômico e a conservação ambiental”.
Marco Aurélio Bedê (SEBRAE): O Papel das Micro e Pequenas Empresas na Distribuição da Renda e da Riqueza no Brasil
“As micro e pequenas empresas pagam salários menores do que as médias e grandes, mas oferecem mais oportunidades aos jovens e às mulheres. Além disso, o aumento da participação das micro e pequenas empresas na economia de um estado melhora o índice de Gini. Quanto maior a participação das micro e pequenas empresas, menor o índice”.
Carlos Brandão (UFRJ): Impacto da Apropriação e Distribuição da Riqueza na Escala Espacial
“Existe muita literatura sobre a distribuição pessoal da renda, mas fala-se muito pouco sobre a distribuição funcional da renda. Quando você quer distribuir a renda, é muito difícil fazer isso sem ampliar a oferta de serviços públicos e bens coletivos. O maior problema é que hoje há ações que penalizam a riqueza nova, aquela que é produzida, mas não a renda e a herança”.
Lauro Mattei (UFSC): A Questão Agrária, a Apropriação e a Distribuição da Riqueza
“Temos uma agricultura de alta produtividade e somos um dos maiores produtores de alimentos do mundo. Mas há mais de 3 milhões de estabelecimentos socialmente fragilizados, ouso dizer que a maioria deles são economicamente inviáveis e nós temos que saber o que fazer com estas pessoas, que chegam a 30 milhões”.
José Roberto Ricken (OCEPAR): O cooperativismo no Paraná e sua Contribuição para a Geração e Distribuição da Riqueza
“Há espaço para novos investimentos, desde que se faça uma análise técnico-econômica acurada. No Brasil, as cooperativas associam 8% da população; no mundo, este número chega a 40%. No Paraná, 38% da agroindústria está nas mãos das cooperativas”.
Luiz Inácio Gaiger (UNISINOS): A diversidade das Ciências Econômicas – Economia Solidária
“Tanto o Papa quanto o economista Thomas Piketty têm opiniões convergentes contra o capitalismo, apontando-o como um modelo concentrador de renda. A economia solidária ajuda a quebrar esta tendência e possibilita a saída de um ciclo utilitarista”.
Fabrício Augusto de Oliveira (CORECON-MG): Taxação de Heranças e de Grandes Fortunas
“Mesmo considerando os países da América Latina, o Brasil supera pouquíssimos na alíquota do Imposto de Renda. Antes da onda neoliberal que atingiu o país nos anos 80 e 90, nós tínhamos 11 faixas de cobrança; agora são apenas três, e a maior chega a apenas 27,5%. Além disso, os impostos atingem muito a classe média e pouco os mais ricos. A política redistributiva não funciona tirando da classe média para dar aos pobres; é preciso tirar dos mais ricos e isso pode ser feito sem grandes consequências macroeconômicas, porque eles têm baixa propensão ao consumo”.
Sílvio Barros (Secretaria do Planejamento e Coordenação Geral do Estado do Paraná): O Planejamento Econômico e a Distribuição de Riqueza
“Qual é a cidade que nós queremos? Em Maringá a sociedade civil organizada se reuniu e elaborou um projeto chamado Maringá 2020. Prefeitos passarão, mas nós e nossas empresas ficaremos aqui. Os projetos que queremos para a cidade não podem sofrer descontinuidade. O político é um administrador contratado pelo voto para governar. Não foi a prefeitura que fez isso. Foi a comunidade que assumiu a cidade como sua e já existem também os projetos Maringá 2030 e Maringá 2047. Hoje nós passamos por um problema sério no país, mas se não houver uma mudança de mentalidade, não vamos achar soluções”.
Roque Pellizzaro (Conselho Adm. SPC BRASIL): Desafios do Setor de Serviços Frente à Conjuntura Econômica
“O Brasil passou por dois momentos. A ascenção social passou por uma demanda reprimida, que explodiu com o aumento do crédito e com os programas sociais. O mercado amadurece, as indústrias se reinventam, o setor de serviços deixa de vender serviços e passa a vender sonhos. A oportunidade está em processos internos que geram redução de custos. Enquanto uns choram, outros vendem lenços”.
Clemente Ganz Lúcio (DIEESE): Políticas Públicas e Impactos na Distribuição de Renda
“Nós podemos ter bem-estar tendo automóveis, mas não qualidade de vida se estes automóveis causarem algum constrangimento ou tornarem a mobilidade urbana um inferno. É preciso pensar esta questão não do ponto de vista individualista, mas também coletivo e ambiental”.
“As políticas públicas, como políticas de desenvolvimento econômico e industrial, precisam ter uma política macroeconômica coerente. Países que deram um salto no potencial de suas micro e pequenas empresas tiveram o apoio de órgãos como o Sebrae”.
Luiz Alberto Machado (Cofecon): A Diversidade das Ciências Econômicas – Economia Criativa
“Desde a terceira revolução industrial, é o intangível que tem um valor cada vez maior. Veja por exemplo uma raquete de tênis: o grip é produzido num lugar, a corda em outro, a borracha em outro, mas quem é que fica com o maior montante no final? É quem concebeu o produto, quem criou o produto”.
“Por que a economia criativa é estratégica? Porque não há nenhuma incompatibilidade entre a criatividade e a sustentabilidade. Os recursos são a criatividade, a capacidade e a inventividade, e tudo isso é ilimitado”.
João Ildebrando Bocchi (PUC/SP): A visão da Sociedade Brasileira de Economia Políica sobre a Distribuição da Riqueza e a sua importância para o crescimento da economia
“O capitalismo na verdade é indústria. É uma produção com produtividade crescente, com uma série de processos, como a acumulação de riqueza ou a concentração de capital nas mãos dos donos dos meios de produção, e este processo continua até hoje”.
“Quando surge a China com seus baixos salários, os outros países tentaram reduzir seus custos baixando salários também, mas era impossível concorrer desta maneira. Agora a China já começou a aumentar os salários e passar algumas cadeias produtivas para outros países onde se ganha menos, mas este processo não é ruim, ao contrário, dinamiza a economia”.
Luiz Alberto Esteves (economista-chefe do CADE): Intervenção do Estado no Setor Público, CADE e Agências Reguladoras
“A maior controvérsia a respeito dos cartéis é no próprio mainstream: na escola de Harvard pensam que o cartel é um problema per se, e o CADE pune até mesmo a tentativa de cartel. Já a escola de Chicago segue a regra da razão, acreditando que às vezes esse arranjo traz benefícios e os benefícios podem compensar o custo. A escola austríaca acredita que o custo da regulação é maior do que se deixar o mercado se autorregular. Mas não tenho comprovações a favor nem contra esta tese”.
“O mercado na área de regulação é promissor para os economistas e a pós-graduação é um requisito importante. Há muita interdisciplinaridade nesta área. Hoje o CADE é uma das melhores agências antitruste do mundo”.
Gesner de Oliveira (Fundação Getúlio Vargas): Recursos Hídricos e a Economia
“Do ponto de vista do mundo, não haveria motivo para o Brasil estar em recessão. O mundo não está em recessão. O que estamos vendo aqui é mais do que a falha de uma presidente ou o equívoco de um ministro. É o fim de um modelo”.
“Enfrentar uma crise hídrica passa por uma mudança cultural. É preciso discutir os incentivos econômicos para resolver este problema. Há o esgotamento de um padrão de uso e produção da água”.
Mario Ramos Ribeiro (UFPA): A visão do Pensamento Liberal sobre a distribuição da riqueza
“Uma criança que em 2002 tinha 8 anos passou pelo mensalão, petrolão, eletrolão e outros escândalos. De todos os custos perdidos (sunk costs), o principal foi a banalização do mal. Ele vai crescer pensando que tem que se dar bem de qualquer jeito, mergulhado na cultura da não produtividade. É preciso haver sanção, e a sanção tem que ser pública”.
“A credibilidade institucional não é definida pela política econômica, mas sim pela economia política. Quando a economia política é quebrada, a política econômica não funciona. Um político pode ter baixa popularidade, mas não baixa credibilidade”.
Ladislau Dowbor (PUC-SP): Sistema Financeiro e o Desenvolvimento
“Outro dia fui ao banco onde tenho uma poupança e a atendente perguntou se eu quero investir nisso ou naquilo e eu falei para ela: nada disso do que você me mostrou são investimentos. Tudo isso são aplicações financeiras”.
“A taxa Selic tem efeitos perniciosos. O cara que não quer investir pode colocar o dinheiro num fundo com o rendimento da taxa Selic. Em vez de se preocupar com a demanda, a qualidade do produto, os custos de mão-de-obra, os problemas trabalhistas, a ampliação da produção e coisas do tipo, ele põe o dinheiro num fundo e esteriliza o investimento produtivo”.
“Precisamos de uma reforma financeira, não de um corte de gastos sociais”.
Marcelo Curado (Associação Comercial de São Paulo): Conjuntura Econômica Brasileira
“Precisamos de algumas mudanças de atitude: não cair no engodo de fazer coisas exóticas na macroeconomia; entender que teremos que nos abrir para sermos competitivos em relação ao mundo, mudar o tamanho do estado e entender que não há almoço grátis, que todos pagam pela saúde e pela educação. Não precisamos de incentivos e sim de regras claras”.
ASCOM COFECON
Escrito por Manoel Castanho (*) e Júlio Poloni (**)